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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Ás de Ouros - Prólogo

Era uma residência grande e luxuosa, no condomínio mais nobre da cidade.

Apesar de já ser quase 11 horas da noite, algumas luzes da casa estavam acesas. Enquanto do lado de dentro da casa aparentava não haver movimento, do lado de fora dois rottweilers circulavam pela grama.

Próximo ao portão de entrada, havia uma pequena guarita de vigilância com apenas um segurança. Três monitores alternavam com imagens das doze câmeras de vigilância espalhadas pela residência, mas o segurança estava mais interessado em dividir a sua atenção entre o programa humorístico de sábado à noite e um gigante sanduíche de bacon.

Rivaldo trabalhava como segurança do turno da noite na residência da Família Gusmão há mais de cinco anos e todos os dias eram sempre tranqüilos. Rivaldo dizia que tinha o melhor emprego do mundo. Ele apenas ficava oito horas seguidas acordado assistindo televisão e até tirava um cochilo de vez em quando. Esporadicamente ele escutava algum ruído ou latidos dos cachorros e ia conferir o que era. Mas era sempre algum gato correndo entre os arbustos ou os cachorros brigando por um motivo qualquer.

Essa era uma noite particularmente quente, e por isso Rivaldo abriu todas as janelas da guarita e deixou dois botões de seu uniforme abertos.

Os cachorros estavam latindo próximo ao muro atrás da guarita. Rivaldo já não se incomodava mais com os seus latidos, mas apenas olhou para trás e ver os cachorros latindo para os arbustos. Depois de alguns segundos, os cachorros pararam de latir e foram correndo para o fundo da casa. Rivaldo concluiu que era apenas um gato suicida e continuou assistindo televisão.

Pouco mais de dois minutos depois, enquanto engolia um pedaço do seu sanduíche e ria de uma piada que ele achou engraçada, Rivaldo foi surpreendido por uma corda fina passando pelo seu pescoço e deitando metade de seu corpo pesado para fora da guarita. Ele tentava reagir, mas não conseguia tirar a corda do seu pescoço nem alcançar o seu agressor. Rivaldo tossia e esperneava. Tentava gritar, mas não passava ar pela sua traquéia.

Não demorou muito para Rivaldo parar de reagir, mas o assassino ainda segurou a corda por mais alguns instantes para ter certeza de que ele estava morto. Em seguida, o assassino empurrou o corpo de Rivaldo para dentro da cabine. Os olhos de Rivaldo ainda estavam abertos e ficaram encarando o seu sanduíche de bacon, agora espalhado pelo chão.

Olhando para os lados para ter certeza de que não estava sendo observado, o assassino entrou na guarita, desligou as câmeras de vigilância e puxou alguns cabos abaixo do equipamento de segurança. Nos monitores apenas apareciam escrito a mensagem piscando que dizia: SEM SINAL.

O assassino estava todo vestido de preto, incluindo um gorro cobrindo todo o seu rosto, tornando-o praticamente invisível na grande e parcialmente iluminada aera externa casa. O assassino corria abaixado, pisando na grama com tanto cuidado que não era possível ouvir som algum. De longe, ele viu os cachorros se distraindo com um pedaço de carne bem generoso.

Na cozinha, Solange Gusmão terminava de preparar a sobremesa que serviria no dia seguinte. Solange tinha 56 anos de idade e era conhecida por seus dotes culinários. Há mais de 15 anos, ela era dona de dois dos mais famosos restaurantes na cidade. Nos finais de semana, ela gostava de preparar diferentes refeições para o marido e o filho e por isso dispensava a cozinheira nesses dias.

Empolgada por terminar a nova sobremesa que ela havia inventado, Solange guardou a sobremesa no freezer e enquanto andava para a pia ouviu um ruído próximo a porta dos fundos. Ela se virou para olhar, mas não viu nada. Não deu importância. Foi até a pia lavar as mãos e de repente se sentiu puxada para trás pelo pescoço.

O assassino passou a corda pelo pescoço de Solange e apertava com força. Solange colocava a mão no pescoço para tentar folgar a corda, mas as suas mãos molhadas a atrapalhavam.

– Desculpe-me – sussurrou o assassino no ouvido de Solange.

Solange ainda tentou lutar por alguns instantes, mas lentamente ela foi parando de reagir até que o seu corpo praticamente caiu nos braços do assassino. Ele colocou o corpo dela cuidadosamente no chão, desligou a torneira e andou na direção da sala.

O assassino se esgueirava pelo corredor, sem deixar de observar os muitos quadros que expostos na parede. Ao passar por um quadro com um pentagrama no céu, brilhando como o sol, segurado por uma mão saindo de uma nuvem, o assassino chegou a rir por um instante.

Apesar de a televisão estar ligada, não havia ninguém na sala. O assassino então foi em direção ao escritório, localizado mais ao fundo da sala. A porta estava entreaberta e olhando de longe, ele viu que Otávio Gusmão estava sentado a sua mesa, na frente do computador. O assassino entrou devagar, mas sem se preocupar em se esconder.

O escritório era grande. Encostada na parede ao fundo havia uma grande estante que ia de uma ponta a outra e estava repleta de livros. Em outra parede, estava exposta uma coleção de espadas japonesas, um conjunto de esgrima e um armário com troféus e medalhas. Sofás pequenos estavam posicionados em outro canto, dispostos como uma pequena sala de estar.

Otávio parecia não ter percebido que alguém havia entrado em seu escritório. Coçou a testa e em seguida colocou a mão direita na perna.

– Não adianta – disse o assassino. – Eu desativei o sistema de segurança.

A voz do assassino saia mais grossa que a de uma pessoa normal.

– O que você quer? Eu te dou todo o dinheiro que tenho no cofre e...

– Eu não quero o seu dinheiro – interrompeu o assassino.

– Você... você machucou a minha esposa?

O assassino ficou calado. Apenas respirou fundo.

– Você... oh, não! – Otávio estava chocado e não conseguiu fazer a pergunta.

– Fiz o que era necessário para chegar até você.

Otávio agora estava respirando forte, como se estivesse com falta de ar.

Aos 53 anos de idade, Otávio não estava em uma má forma física, mas ele sabia que não teria condições de lutar contra o assassino. Era visivelmente mais forte que ele.

– Eu não tenho nada além do meu dinheiro a te oferecer.

O assassino andou na direção de Otávio e se apoiou na mesa.

– Você sabe por que eu estou aqui – disse o assassino, com convicção.

Otávio ficou calado.

– Eu posso ficar a noite toda, Otávio.

O assassino andou na direção da coleção de espadas japonesas.

– Temos coisas bem interessantes aqui.

E puxou uma katana. Desembainhou a espada e conferiu a sua lâmina afiada.

Otávio parou e refletiu por uns instantes. Ele respirou fundo e se virou para o assassino.

– Isso significa que você não vai me deixar sair daqui com vida, não é?

– Exatamente – o assassino falou sem titubear e sem olhar para Otávio. – Mas ainda assim nós podemos ter uma conversa agradável.

Otávio cruzou os braços, como tivesse se rendido.

–Parece que não há outro jeito...

O assassino virou-se para Otávio.

– Finalmente, parece que estamos nos entendendo.

– Então... sobre o que você quer conversar?

O assassino sentou na cadeira de frente para Otávio, colocou a katana no colo e retirou o gorro que cobria o seu rosto.

Um comentário:

Marcos Jorge disse...

Fui pego de surpresa essa quarta-feira, mas foi uma boa surpresa!!!

Que mais e mais surpresas como essa apareçam!

Já estou acompanhando "Ás de Ouros"!

Abraço