– Vocês viram como a polícia tratou de chegar logo no local e com uma grande equipe de investigação? – falava Katarina Glock em tom de denúncia. – Eles chamaram a melhor equipe de detetives para investigar o caso. Por que? Ora, meu povo, por que o crime ocorreu na terra dos riquinhos! Não foi aí no seu bairro onde...
Carlos desligou a televisão e se virou para os demais que estavam sentados na sala de reunião.
Edson estava espojado em uma cadeira no fundo da sala mordendo o fundo de um lápis, Silvia estava na frente, costumeiramente, mascando chiclete, Luís Fernando estava no lado oposto a Silvia, próximo a porta. Carlos estava em pé na frente de uma louça e segurando uma caneta.
– Então é isso: não temos nenhum suspeito em um homicídio em que a mídia vai pegar no nosso pé para obter informações.
– Foi tudo muito limpo – comentou Silvia.
– Não existe “foi tudo muito limpo”.
– Você entendeu o que eu quis dizer – rebateu Silvia. – Essas fotos da cena do crime não vão nos dizer até que nós possamos entender o que estava acontecendo com Otávio. Até que possamos começar a ouvir as pessoas. Antes disso nós só podemos fazer deduções e inferências a partir de nossas próprias pesquisas em contas bancárias e coisas do tipo.
– Isso significa que nós já temos um ponto de partida – argumentou Carlos de forma conclusiva.
– Parece que enquanto não nós interrogarmos nenhum membro da família estaremos apenas brincando de detetives – comentou Edson, balançando os pés apoiados em uma cadeira.
– Então por que não fazemos desse o nosso ponto de partida? – perguntou Luís Fernando.
– Um caso como esse requer um cuidado especial – respondeu Carlos. – A imprensa estará acompanhando todos os nossos passos. Precisaremos dar algumas respostas a eles o quanto antes para que eles possam ficar repetindo essa mesma coisa durante algum tempo. Vamos interrogar os familiares e amigos após o enterro das vítimas, o que eu acredito que será realizado amanhã a tarde.
– Podemos começar entrevistando os familiares do segurança assassinado então – sugeriu Luís Fernando, visivelmente tentando encontrar uma solução fácil.
– Não temos nenhuma razão para suspeitar do envolvimento do segurança. Ele foi morto de uma maneira que não aparenta ter feito qualquer contato visual com o assassino, facilitando a sua entrada ou algo assim.
– Então o segurança do condomínio? – Luís Fernando insistia.
– Já sabemos o que vamos ouvir dele. Ele vai dizer que não viu nada, que estava atento o tempo todo... aquele velho blá blá blá.
– É óbvio que em um caso como esse o assassino planejou a sua entrada no condomínio sem ser notado – Edson falava como se tivesse ensinando algo a Luís Fernando.
Carlos parou e pensou por um instante.
– Na verdade, Luís Fernando, eu gostei de sua sugestão.
Todos se espantaram ao ver Carlos consentir com uma ideia que pareceu óbvia de mais.
– Interrogar o porteiro do condomínio será um ótimo alimento para a imprensa. E como Edson falou, esse assassino planejou a sua entrada com bastante cautela. O que significa que ele já havia entrado no condomínio antes – Carlos apontou para Edson com a caneta em sua mão. – Edson, eu quero que você descubra que tipos de serviços Otávio Gusmão e sua esposa solicitaram nos útlimos seis meses. Seja bombeiro, encanador, jardineiro, qualquer coisa – agora ele apontava para Luís Fernando. – E você ficará responsável por interrogar o porteiro do condomínio.
– Eí, não podemos esquecer das mensagens bizarras na parede e esse tal de Ás de Ouros! – advertia Silvia.
Nesse instante, Marcone entrou na sala com cara de cansado.
– Desculpem o atraso – falou enquanto se sentava. – Perdi o horário e acabei pegando... – não conseguiu segurar um bocejo – um engarrafamento infernal – e parecendo que havia tomado noção da situação. – E por que essa discussão inicial está sendo aqui mesmo?
– Por que tem alguém querendo se promover – Carlos falava segurando a caneta com a mão esquerda e batendo ela na mão direita, apontando para o lado de fora da sala, na direção de César Barbosa.
César Barborsa era um homem careca, já com os seus 55 anos, mas aparentando ter um pouco mais. Sua voz era rouca, por conta do cigarro e tinha uma barriga avantajada que todos sabiam ser culpa da cerveja, apesar dele sempre dizer que era por conta de um problema na tireóide. César era o delegado chefe da Delegacia de Homicídios e todos sabiam que ele sempre tentava ao máximo se promover. Ele costumava sorrir para todos, mas era um sorriso que não inspirava confiança em ninguém. Todos já haviam escutado casos de César prejudicando qualquer funcionário de alguma maneira que o beneficiasse apenas a ele mesmo. César estava andando na direção da sala, mas nenhum dos presentes na sala de reunião disfarçou para olhar quando Carlos, discretamente, apontou para ele.
– Então isso significa que as investigações serão feitas apenas por nós aqui?
– Oficialmente, não – respondeu Carlos, de maneira seca.
Marcone assentiu a cabeça, indicando que havia entendido as palavras de Carlos.
No instante em que Marcone repousou as suas coisas sobre a mesa, César entrou na sala.
– E o que temos até agora, grande Agente Carlos Almeida? – César falava com o seu tom amigável de sempre.
Marcone não conseguiu disfarçar um sorriso.
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